A Bolívia se prepara para as eleições gerais no próximo 17 de agosto, marcada por uma profunda divisão na esquerda e o avanço da direita nas intenções de voto. O país elegerá presidente, vice, 130 deputados e 36 senadores, em um cenário político inédito desde a ascensão do Movimento ao Socialismo (MAS) ao poder, em 2006.
Evo Morales defende voto nulo e ataca antigos aliados
Impedido de concorrer por já ter cumprido três mandatos, o ex-presidente Evo Morales se posicionou contra os atuais nomes do MAS e passou a incentivar o voto nulo. Ele também denuncia perseguição política enquanto responde a uma acusação de estupro de menor, a qual nega.
Além disso, bloqueios de estradas promovidos por seus apoiadores em junho deixaram ao menos quatro mortos, aumentando ainda mais o desgaste do movimento que o consagrou por quase duas décadas.
Esquerda rachada e queda de popularidade
O atual presidente Luis Arce, desgastado por uma crise econômica, desistiu da reeleição e lançou como sucessor o ex-ministro Eduardo De Castillo, que aparece com apenas 2% nas pesquisas.
Outros nomes da esquerda como Andrónico Rodríguez, ex-presidente do Senado, e Eva Copa, prefeita de El Alto, também enfrentam baixa adesão. Andrónico caiu para cerca de 6% nas intenções de voto, enquanto Copa desistiu da candidatura por falta de estrutura nacional do partido recém-criado, Morena.
Segundo o professor Clayton Mendonça Cunha Filho (UFC), Evo “implodiu o partido” ao insistir em ser o único representante legítimo do MAS. O especialista alerta que o partido pode não alcançar a cláusula de barreira de 3%, tornando-se minoritário no parlamento.
“O MAS, que era uma frente ampla com diversos movimentos sociais, sindicatos e indigenistas, foi desestruturado pelo personalismo de Evo”, analisa Cunha.
Direita lidera pesquisas com Samuel Medina
Na ausência de uma candidatura sólida da esquerda, a direita ocupa os primeiros lugares nas pesquisas com Samuel Medina (Alianza Unidad) e Jorge “Tuto” Quiroga (Alianza Libertad Y Democracia). Juntos, somam cerca de 47% das intenções de voto, segundo levantamento publicado pelo jornal El Deber.
Medina, favorito até o momento, é um megaempresário que foi ministro na década de 1990 e já disputou a presidência em 2014, ficando em segundo lugar. Já Quiroga, ex-presidente entre 2001 e 2002, representa a direita tradicional e foi vice de Hugo Banzer, além de porta-voz internacional no governo interino de Jeanine Áñez.
Possível segundo turno e teste para Constituição de 2009
De acordo com a lei eleitoral da Bolívia, um candidato vence no primeiro turno com mais de 50% dos votos ou 40% com 10 pontos de vantagem sobre o segundo colocado. Como os dois principais candidatos da direita ainda não ultrapassaram essa margem individualmente, um segundo turno em 19 de outubro é considerado provável.
Essa será a primeira eleição presidencial em que o vencedor não terá participado da criação da Constituição de 2009, que instituiu o Estado Plurinacional da Bolívia, dando protagonismo aos povos indígenas.
“Será um teste de fogo para a nova institucionalidade”, destaca Cunha. “Mesmo um governo de direita deverá negociar com outras forças e terá dificuldade para desmontar esse modelo.”