O que começou como uma investigação por desvio de salários revelou um verdadeiro enredo criminoso digno de série policial: um cofre com R$ 300 mil em espécie, armas de fogo incluindo um fuzil, prática de agiotagem usando imóveis como garantia e um patrimônio milionário incompatível com o salário público.
Esse é o retrato do esquema supostamente liderado pelo vereador Rosinaldo Ferreira da Silva, o “Rosinaldo Bual” (Agir). Primeiramente, a polícia o pendeu na manhã desta sexta-feira (3/10) em Manaus, após o Ministério Público do Amazonas (MPAM) deflagrar uma operação baseada na denúncia da ex-assessora Janderlani Cristina Lima Araújo.
Rachadinha, lavagem de dinheiro e crime organizado
De acordo com o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), o vereador é acusado de liderar um esquema de rachadinha, no qual exigia a devolução de 40% a 50% dos salários dos servidores comissionados do seu gabinete. Desse modo, mantinha até 50 servidores nomeados, embora o espaço físico comportasse menos de 10 pessoas.
Além do peculato e concussão (arts. 312 e 316 do Código Penal), o esquema envolve organização criminosa (Lei 12.850/13) e lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98), durante os mandatos de 2017 a 2025.
Movimentação milionária: R$ 5,2 milhões com salário de R$ 996 mil
Ademais, análises financeiras e fiscais mostram uma discrepância escandalosa entre os rendimentos declarados pelo vereador e o dinheiro que movimentava:
- Rendimento oficial (2017-2023): R$ 996.012,05
- Movimentação bancária: R$ 5.276.836,96
- Diferença inexplicada: R$ 4.280.824,91
Em 2017, Rosinaldo Bual declarou patrimônio zero. Desde então, adquiriu imóveis, manteve altas quantias em espécie e financiou um estilo de vida incompatível com o cargo público.
Cofre, armas e agiotagem
Dois inquéritos policiais reforçam o absurdo da situação. No primeiro, após um furto em uma das casas do vereador, foram encontrados:
- Um cofre com R$ 300 mil em dinheiro vivo
- Quatro armas de fogo, incluindo um fuzil
O segundo inquérito aponta que Rosinaldo Bual praticava agiotagem, usando imóveis como garantia para empréstimos ilegais.
Operadores do esquema e familiares envolvidos
O MPAM também identificou um grupo de pessoas ligadas ao vereador, com funções específicas dentro da organização criminosa. Entre os nomes:
- Luzia Seixas Barbosa (“Luciana”) – Chefe de gabinete e principal operadora do esquema
- Neiva Picanço – Ex-companheira que cedia contas bancárias para lavar dinheiro
- Lucilene Barbosa (“Carolaine”) – Coletora de valores desviados
- Bianca Lobo – Sobrinha do vereador, com aquisição de imóvel irregular
- Rayeli Ferreira – Sobrinha e ex-assessora, com movimentações incompatíveis
- Gabriel Barbosa – Filho de Luzia, acusado de articular o furto do cofre
Além disso, foram citados outros assessores comissionados e até o nome de um agiota chamado “Christian”.
Provas e materialidade dos crimes
Portanto, a investigação do Gaeco trouxe farto material probatório, incluindo:
- Depoimentos da delatora Janderlani Lima
- Transferências bancárias sistemáticas de assessores para os investigados
- Mensagens em grupos de WhatsApp com cobranças de valores
- Comprovação de vínculos empregatícios incompatíveis com o serviço público
- Patrimônio oculto e não declarado
- Acesso indevido à Câmara Municipal de Manaus (CMM)
Prisão preventiva e risco à investigação
O MPAM solicitou a prisão preventiva do vereador e de sua chefe de gabinete com base em:
- Risco de coação a testemunhas
- Possibilidade de destruição de provas
- Reiteração criminosa
- Intimidação com uso de armas de fogo e cargo político
Posteriormente, a Justiça aceitou os argumentos, considerando os indícios robustos e o grau de organização do esquema.
CMM se manifesta
Por fim, a Câmara Municipal de Manaus (CMM) divulgou nota afirmando que colabora com o MP e reitera seu compromisso com a legalidade e transparência. As diligências foram realizadas no gabinete de Rosinaldo Bual, mas o Legislativo afirmou estar à disposição das autoridades competentes.