Em agosto, o cientista Lucas Ferrante, doutorando em biologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, o Inpa, também alertou sobre esse risco. Ele publicou na Nature Medicine – uma das revistas científicas mais importantes do mundo – um texto intitulado “Políticas do Brasil condenam a Amazônia a uma segunda onda de COVID-19“. Para ele, “o governo do estado foi negligente quando determinou a abertura do comércio, a volta às aulas, a abertura de bares, de templos e igrejas de maneira precoce e, aliado a isso, reduziu a quantidade de testes”.

Questionada sobre os erros no boletim epidemiológico, a diferença de 24% no números de mortes registradas pelo SIVEP-Gripe e a redução dos testes, a FVS limitou-se a dizer que “alerta para o aumento de 12% no número de casos de Covid-19 na comparação entre as últimas duas semanas em Manaus”, mas que há “estabilidade de número de casos” no estado.

Em tese, quem mais ganharia com a narrativa do fim da covid-19 em Manaus capitaneada pelo grupo Samel é o deputado estadual e candidato a prefeito Luís Ricardo Nicolau, do PSD. Irmão do médico Luís Alberto Nicolau, que coordenou o hospital de campanha da capital, o deputado chegou a pedir afastamento da Assembleia Legislativa do estado no início da pandemia para se “dedicar integralmente ao combate ao coronavírus” na função de diretor do grupo Samel. A dedicação do político, no entanto, não parece ter surtido efeito. Na pesquisa mais recente ele aparece com apenas 5% das intenções de voto.

Líder da corrida pela prefeitura, o ex-governador Amazonino Mendes, do Podemos, não achou necessário sequer incluir os efeitos do coronavírus na cidade em seu plano de governo. Apesar disso, foi um dos primeiros a criticar o governador Lima pela “falta de união” com o prefeito de Manaus, Arthur Vírgílio, do PSDB, na condução da pandemia. O tucano, que ficou 31 dias internado em estado grave por conta da covid-19, defendeu na semana passada um novo lockdown para conter o vírus. Ele propôs a medida ao governador Lima, que já descartou a possibilidade. No site da FVS, o maior destaque até o dia 15 de setembro era para notícias que mostram a quantidade de recuperados, em uma estratégia semelhante ao “placar da vida“, usado pelo governo Bolsonaro para ocultar as milhares de mortes causadas pela covid-19 no Brasil.

Nesta quarta, o estado retoma as aulas presenciais no ensino fundamental. “Não é o retorno do ano letivo que está promovendo esse aumento da covid”, disse em entrevista coletiva o governador, sem citar dados que atestem essa afirmação – nem mesmo os números contestáveis da FVS.

Matéria do The Intercept Brasil