O novo longa-metragem de Marcos Tupinambá, “O Bagre, a Menina e o Rio”, está em fase de finalização do roteiro e, recentemente, concluiu seu cronograma com destaque para ações de acessibilidade cultural. Durante os meses de junho e julho, a Coletiva de Palhaças promoveu sessões inclusivas de contação de histórias em escolas e instituições. As atividades envolveram crianças e adolescentes surdos, cegos, com baixa visão e do ensino regular, com o propósito de apresentar lendas amazônicas de forma lúdica e acessível.
O roteiro do filme foi contemplado pelo edital nº 01/2023 de Fomento às Artes – categoria Audiovisual, por meio da Lei Paulo Gustavo. A iniciativa conta com recursos do Governo Federal, via Ministério da Cultura, e execução do Governo do Amazonas, por intermédio da Secretaria de Cultura e Economia Criativa.
Segundo Tupinambá, as ações fazem parte da contrapartida social do projeto. “Realizamos oito sessões para aproximadamente 400 crianças, com adaptações específicas para o público com deficiência auditiva. Contamos com intérpretes de Libras para garantir acessibilidade plena”, explica o diretor e roteirista.
Além disso, as sessões apresentaram ao público infantojuvenil narrativas baseadas em lendas e mitos amazônicos — como Iara, Muiraquitã e Cobra-Grande —, seres mágicos que há séculos habitam o imaginário regional. Por meio de uma abordagem interativa, o projeto visa estimular a imaginação e despertar o interesse das novas gerações pela cultura oral da Amazônia. Essa tradição, por sua vez, representa um patrimônio imaterial em risco, diante do avanço da cultura globalizada.
Roteiro e ambientação
“O Bagre, a Menina e o Rio” propõe reinserir símbolos amazônicos na contemporaneidade, unindo o realismo mágico latino-americano a temas sociais atuais. O enredo acompanha Jennyffer, uma jovem transgênero, e Pirarara, o menino cabeça-de-bagre. Juntos, eles representam a interseção entre o mundo real e o fantástico.
Para o roteirista, essa fusão não apenas fortalece a cultura local, como também contribui para a preservação de histórias que poderiam cair no esquecimento. “O cenário também exerce papel essencial. As palafitas do bairro Educandos, à margem do Rio Negro, simbolizam a resistência e a identidade regional”, destaca Tupinambá.
Dessa forma, ao ambientar a trama nesse espaço, o diretor busca dar visibilidade a comunidades frequentemente marginalizadas. Segundo ele, o filme possui potencial de atingir públicos diversos, tanto local quanto nacional e internacionalmente.
“O longa oferece um retrato fiel da vida nas margens do Rio Negro, abordando desafios e superações do cotidiano. Com isso, ajuda a desconstruir estereótipos e promove a inclusão social. Afinal, grandes histórias podem surgir de qualquer lugar”, afirma o diretor.
Portanto, além de apresentar uma narrativa envolvente sobre amizade e amor, o projeto resgata e valoriza elementos da cultura amazônica, amplia o debate sobre temas sociais e amplia a representação de grupos historicamente excluídos. “É uma contribuição valiosa para o cenário cultural do Amazonas e, inclusive, para o país como um todo”, finaliza Tupinambá.
Inclusão e tradição oral
Enquanto isso, a Coletiva de Palhaças também apresentou, ao longo de junho e julho, o espetáculo “Rosalinda, a Cobra Encantada da Amazônia”. A peça foi levada a escolas e instituições e convidou as crianças a mergulharem em uma fábula sobre amizade e liberdade, inspirada na cosmovisão amazônida.
Através da personagem Rosalinda, uma cobra encantada, a narrativa resgata o universo dos encantados da floresta. Com isso, promove valores como o respeito à natureza, à diversidade e à sabedoria ancestral presente nos rios e matas da Amazônia. “Essa proposta reforça nosso compromisso com a acessibilidade e a valorização das narrativas amazônicas. Ela articula tradição oral, arte cênica e educação sensível às diferenças”, afirma Ananda Guimarães, consultora de acessibilidade e integrante do GT de Acessibilidade Cultural da Funarte.
Por outro lado, Ananda ressalta que pensar acessibilidade apenas como exigência técnica ou legal é uma visão limitada. “A importância do projeto está em tratá-la como fruição artística. As contadoras realizam uma narração bilíngue — português e Libras —, o que é fundamental inclusive para crianças que não têm deficiência, mas que ainda não compreendem essas diferenças por falta de convivência”, pontua.
Ao todo, o projeto passou por instituições como a Filippo Smaldone, Escola Estadual Augusto Carneiro, Lar Fabiano de Cristo, Escola Cívico-Militar Fueth Paulo Mourão e Escola Estadual Presidente Castelo Branco. Dessa maneira, consolidou-se como uma iniciativa que une inclusão, arte e valorização da cultura regional.